Autora de vários livros, Mirella Faur nos conta as experiências que lhe permitiram lançar o “Anuário da Grande Mãe”
Jornal O Legado - Quem é Mirella Faur?
Mirella Faur - Fui a iniciadora do movimento da espiritualidade feminina conhecido como o “Ressurgimento do Sagrado Feminino”, ou “O retorno à Deusa”, em Brasília, com a realização de rituais públicos de plenilúnios e celebrações da Roda do Ano, condução de grupos de estudos e celebração de ritos de passagem. Por mais de 20 anos dirigi o Círculo Sagrado na minha Chácara Remanso, reunindo centenas de mulheres em cerimônias, jornadas xamânicas e rituais públicos centrados nos arquétipos e mitos de Deusas das várias culturas antigas. Após minha mudança de Brasília em 2006, os fios entrelaçados por mim continuam a ser tecidos pelas minhas discípulas da Teia de Thea e por muitas outras mulheres que honram a sacralidade feminina.
JOL - Sabemos que estudou e fez parte de vários grupos de estudos nas áreas do espiritismo, parapsicologia, ufologia, umbanda esotérica, entre outras. Que tipo de mudanças esses estudos lhe trouxeram, comparando a mulher que era você com a mulher de hoje?
MF - Nasci na Romênia durante a guerra e vivi por 27 anos em um país de doutrinação comunista e opressão materialista. Apesar dos meus anseios, não me foi possível qualquer busca metafísica ou orientação espiritualista. Chegar ao Brasil me trouxe a possibilidade não apenas da minha realização pessoal e profissional, mas principalmente a libertação da minha alma, seguindo a busca da minha mente e o chamado do meu coração. Ampliei meus conhecimentos esotéricos, melhorei a minha conexão com as forças da natureza e os seres da criação - sou vegetariana há 47 anos, empenhada em atividades ecológicas e ambientais -, aprendi a ser mais tolerante, compreensiva e compassiva com os desafios e dificuldades humanas, consegui fortalecer minhas práticas de equilíbrio psico-físico e conexão espiritual.
JOL - Você diz que a Deusa lhe designou um trabalho. Quem é essa Deusa e que trabalho é esse?
MF - Em uma viagem em 1991 para Glastonbury, Inglaterra, tive uma visão que me indicava em que direção concentrar as minhas buscas místicas e assim alcançar a realização da minha missão espiritual. Por sentir a falta da Sacralidade Feminina nos caminhos percorridos - ou seja, a ausência do princípio gerador feminino complementando o princípio criador masculino - deveria dedicar os meus estudos, vivências e realizações nesta direção. Fiz o que senti e percebi e assim criei grupos de estudo com mulheres tendo os mesmos interesses, realizando palestras, rituais públicos, vivências xamânicas, ritos de passagem. Além disso, fui levada a escrever artigos e livros por faltar material em língua portuguesa para a documentação das mulheres. A Grande Mãe é multi-facetada e se apresenta em inúmeros aspectos e nomes de Deusas, em função do objetivo e forma de conexão de quem a procura.
JOL - O desenvolvimento de suas pesquisas, estudos e conclusões se deu, também, por intermédio de vivências com grupos de mulheres no Brasil, Inglaterra, Irlanda, Escócia, Estados Unidos, Sicília, Malta, Grécia, Creta e França. Conte-nos um pouco dessas suas experiências.
MF - Por não ter naquela época (1991) grupos que praticassem a Tradição da Deusa no Brasil, fiz várias viagens nos países onde teve início a formação das religiões e culturas milenares da Deusa. Assim, lendo e tendo vivências nos antigos lugares sagrados, pude também ter acesso aos meus próprios registros ancestrais, resgatando memórias, usando meus conhecimentos e a minha inspiração e adaptando-os para a realidade contemporânea.
JOL - Em poucas palavras, o que é o Sagrado Feminino?
MF - Durante os milênios da supremacia patriarcal, refletida nos valores espirituais, religiosos, culturais, sociais, comportamentais e amparada pela hierarquia divina masculina, foi negada e reprimida qualquer manifestação da energia feminina, divina e humana. Resultou assim uma cultura exclusiva e destrutiva, centrada na violência, conquista e dominação, com o consequente desequilíbrio global que vivemos. A Sacralidade Feminina é a manifestação da energia geradora, criadora, nutridora, sustentadora e transformadora do princípio divino, cósmico, telúrico e ctônico. A Grande Mãe representa a totalidade da criação e a unidade da vida, pois ela é imanente, ela existe e reside em todos os seres e em todo o universo, ela é intrínseca à força da vida, aos ciclos da natureza e aos processos de criação.
O reconhecimento do Sagrado Feminino deve ser uma busca de todos, porém cabe às mulheres uma responsabilidade maior, devido à sua ancestral e profunda conexão com os arquétipos, atributos, faces, ciclos e energias da Grande Mãe. Uma nova consciência do Sagrado Feminino surgirá tão somente quando for resgatada a conexão espiritual com a Mãe Terra, percebida e honrada a Teia Cósmica à qual todos nós pertencemos e assumida a responsabilidade de zelar pelo seu equilíbrio e preservação. Ao restabelecer o ponto de equilíbrio na balança das polari¬dades feminina e masculina, poderemos celebrar e nos alegrar com o retorno à Deusa Mãe, não como um substituto para o Deus Pai, mas como sua consorte, sua complementação perfeita, levando à união dos opostos e assim para a criação de um mundo de paz, amor e harmonia. Esse é o verdadeiro significado do Hieros Gamos, o “casamento sagrado” que cria a unidade, concilia diferenças, apara arestas e integra as polaridades do Pai Céu à Mãe Terra, gerando um Mundo Novo para um novo ser humano.
JOL - Agora que já sabemos um pouco de você e de seus trabalhos, conte-nos sobre seu recente livro, o Anuário da Grande Mãe. Ele é um livro só para mulheres? É preciso ser espírita para compreender sua leitura?
MF - O Anuário não é um livro espírita, como é conhecida a doutrina criada por Allan Kardec e seus seguidores. Pode ser considerado um livro espiritualista por divulgar assuntos, práticas e mitos que favorecem o despertar espiritual e a evolução da consciência. Qualquer mulher será beneficiada ao integrar no seu cotidiano conceitos e práticas que favoreçam a sua afirmação e fortalecimento espiritual, em um mundo contemporâneo materialista e patriarcal. Também os homens podem se beneficiar em saber como colaborar para honrar os valores sacros femininos, respeitar a mulher e a Mãe Terra e se empenhar em construir - em parceria - um mundo mais harmonioso e em equilíbrio eco espiritual.
JOL - Para encerrarmos, o que você poderia dizer em especial aos nossos leitores?
MF - Honrar e comemorar a Grande Mãe sob todos seus múltiplos nomes, aspectos e atributos, criados e perpetuados ao longo de milênios nas várias culturas, regiões e idiomas, reforça os laços en¬tre nós, homens e mulheres, fazendo-nos sentir, não apenas nas palavras, mas também no pulsar dos corações, o significado da irmandade, já que somos todos irmãos, filhos da Deusa, partes interligadas do Todo.
Nota da redação: A Editora Alfabeto está lançando neste mês de Agosto o Anuário da Grande Mãe - www.editoraalfabeto.com.br
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